PARSONS: O ACTOR
ROBERT MERTON
Orientação
Motivacional da Acção
I.
a acção entre dois pólos: interiorização de padrões Vs
instrumentalidade da acção
II.
acção vista em termos de problemas a resolver e de gratificações
* cognitivo * catético * avaliativo SITUAÇÕES E PESSOAS
||
Afectivo integrar
os aspectos cognitivo e de valores - avaliativo (sem conflito e sem
contradição)
O
pólo instrumental tem mais a ver com a estrutura da situação. Como
oportunidades em função de custos e benefícios.
Qualquer teoria
da acção fundada numa racionalidade instrumental – a teoria económica, por
exemplo – é absolutamente incapaz de explicar as dinâmicas do sistema de acção.
O significado
motivacional das condutas do papel não pode ser o mesmo para todas as
personalidades: quando se está a desempenhar papéis isso não esgota todas as
motivações e interesses da personalidade: aspectos narcísicos e de criatividade
dos actores ficam de fora (a personalidade não é inteiramente mobilizada).
Não tem de haver
um ajustamento entre as diferenças constitucionais da personalidade (resultado
da socialização) e os papéis existentes e disponíveis nesse momento, o que
matiza um pouco a teoria parsoniana.
A principal crítica
dirigida a Parsons foi que ele querendo seguir a linha de Weber acabou por se
deixar subordinar ao sistema: actor como um mero suporte do sistema, que ainda
por cima está super-estruturado (num grau muito elevado).
No entanto, é
importante reter que a sociedade, apesar de tudo, é muito mais estruturante do
que aquilo que expontaneamente admitimos – efeito de naturalização do social. Só nos apercebemos em situações
disruptivas desse efeito. As estruturas existem e orientam as nossas condutas.
Parsons deixou
elementos importantes acerca da estruturação do social. Esta vai buscar muitos
elementos (referenciais) ao sistema cultural, que está no topo da hierarquia da
acção sistémica. Vai-se aí buscar todo um acervo de conhecimentos.
A acção humana tem sempre lugar num quadro
de relações sociais e num quadro cultural. Os actores defrontam-se com esse
quadro de duas maneiras: tiveram uma experiência de socialização; segundo,
estão em situação, que também tem uma determinada estrutura.
Os aspectos
catético e avaliativo podem ser aproximados.
Quando se fala
de valores está-se também a remeter para aspectos afectivos, mobilizam-nos, se
não não são valores.
Durkheim falava de dois aspectos da
educação: o aspecto moral (avaliativo) e o aspecto lógico (cognitivo).
Marx, comentado
por Raymond Boudon, a propósito da sua concepção de ideologia: o aspecto das
ilusões desculpáveis (pertencem ao aspecto lógico, cognitivo) – são
directamente inspiradas pela estrutura da realidade (a propósito da
fetichização da mercadoria: não é isso que as pessoas observam através do valor
das mercadorias, que oculta as relações sociais de produção; o aspecto dos
actores produzem elaborações simbólicas acerca dos seus interesses e objectivos
(aspecto avaliativo).
A noção de ethos em Weber (orientação por valores) aproxima-se do aspecto avaliativo.
Em Bourdieu, os
esquemas de percepção (avaliativo) e avaliação (lógico) - «o ponto de vista é a vista que se tem a partir de um ponto» - na
sua noção de habitus.
A noção de sistema de acção de Parsons é
particularmente importante. Chama a atenção para o facto de existirem universos
sociais, em diferentes escalas, que têm uma certa autonomia (ganham uma
dinâmica própria) e que a sua existência e emergência (multiplicação) é
qualquer coisa de típico nas sociedades modernas – diferenciação. Weber também
fala em separação, em determinada altura, da arte e da religião.
ROBERT MERTON
(1910-2003)
Propõe uma
reformulação da perspectiva funcionalista.
- Crítica da análise funcional
- Paradigma da análise funcional
- Actor e estruturas
Crítica
Faz uma crítica
a Parsons, indirectamente, através da sua crítica aos antropólogos
funcionalistas. A análise dos antropólogos assenta em três postulados
(pressupostos) criticáveis:
- unidade funcional da sociedade
- funcionalismo universal
- necessidade funcional
Quanto ao
postulado 1, no mesmo está implícito que os elementos culturais e sociais
apresentam uma coerência entre si que contribuem para a integração da
sociedade.
Merton pensa que
as sociedades estão longe de ter o grau de integração que a análise
funcionalista pressupõe. Ela deixa escapar que diversos elementos, nos seus
requisitos funcionais, podem ter consequências muito diferentes para diversos
grupos – a sociedade é também ela fortemente diferenciada. Certas instituições
podem ser funcionais para certos grupos e não o ser para outros. Os valores da
religião podem estar em contradição com valores não religiosos de outras
pessoas que fazem parte da sociedade.
Merton não deixa
de fazer o reparo de que as sociedades primitivas não serem tão diferenciadas
socialmente como as sociedades modernas.
Quanto ao
postulado 2, este tem implícito que todos os elementos sociais e culturais têm
uma função. Merton pensa que não é necessariamente assim. Advoga uma análise
empírica para observar essa funcionalidade, em relação à sociedade global, e em
seguida para a especificação dessa função e dos seus mecanismos.
Quanto ao
postulado 3, está implícito que qualquer elemento social ou cultural é
indispensável. Se ele for retirado isso prejudica a integração do todo.
Merton desdobra
a sua análise neste ponto: nas funções em si mesmas; nos aspectos concretos que
podem realizar essas funções – dispositivos.
A análise
funcionalista tem presente que não possam existir outros elementos de
substituição no desempenho de uma função – elementos
equivalentes ou substitutos funcionais: que podem desempenhar a mesma
função com igual eficácia. Mertton diz que nem nos organismos biológicos isso é
verdade.
O máximo a que
podemos aspirar são teorias de médio
alcance, a partir de generalizações empíricas de pequena escala.
INTERACCIONISMO
SIMBÓLICO
ETNOMETODOLOGIA
Pequena
incursão histórica
As raízes do
interaccionismo simbólico estão na escola de Chicago – anos 20 e 30 do século
XX. Herbert Blumer cunhou o termo em 1938.
George Herbert
Mead tem uma formulação mais desenvolvida.
O
interaccionismo simbólico espraia-se até aos anos 50, 60. Por exemplo, nos
trabalhos de Anselm Strauss.
Anthony Giddens, Novas regras do método sociológico,
1976.
Características
comuns
Dão uma forte ênfase
à acção social.
Revelam
racionalidades de acção onde se veriam apenas acções irracionais.
A ideia de que
as estruturas são muito instáveis, dependendo muito do protagonismo dos actores
(excepto em Erwin Goffman).
A reabilitação do papel do actor e
especialmente das competências do actor: natureza e características dessas
competências O actor não é um idiota cultural
(Garfinkel).
Interaccionismo
Simbólico
Escola de
Chicago:
William
Thomas (1863-1947) Ideia de definição
de situação: os actores não se limitam a receber orientações de conduta,
mas participam activamente na definição da situação: se os actores definem situações como reais então são reais as suas
consequências.
Ideia de processos de desorganização institucional
como terreno de reorganização institucional.
Robert
Park (1864-1944) A
sociedade não confronta os indivíduos apenas com sistemas de coerção, mas pode
ser experienciada como fonte de libertação, de inspiração para energias
espirituais escondidas.
A ordem social pode ser moral: resulta dos valores na acção
colectiva.
A ordem ecológica: resulta dos desvios sistemáticos da acção colectiva
das suas intenções ou a ocorrência sistemática de acções não coordenadas.
George
Herbert Mead (1863-1931) O
que diferencia os humanos dos animais é que eles têm um eu que é apreendido reflexivamente: é-se simultaneamente sujeito e
objecto. Os homens podem reagir sucessivamente perante determinados tipos de
circunstâncias de maneiras diferentes, pois podem rever essas situações de
acordo com a sua aprendizagem. Capacidade para tomar relativamente a mim
próprio atitudes que os outros tomam relativamente a mim. Ser capaz de adoptar
o ponto de vista dos outros, em especial dobre si próprio. Reagimos ao outro
generalizado, ao que é típico que os outros pensam sobre nós, pois não
podemos reagir sobre o que cada um
pensa de nós. Há a partilha de significados e uma comunicação intensa através
da linguagem. Existe uma
interacção permanente entre o Me (eu reflexivo) e o I através de um diálogo interno: a reflexividade tempera a
tendência de introdução do I de
inovação nos papéis sociais: realização de uma síntese do eu no self.
Herbert
Blumer (1900-1987) Crítica da análise das relações entre
variáveis, pois esta não permite ter em conta o processo em si mesmo (vê um
esquema tipo estímulo-resposta), nem nada diz sobre os actores. Os actores podem iniciar linhas de acção sem
estar à espera que haja condições propícias às mesmas: a acção humana é
deliberativa e criativa. As circunstâncias não existem em si mesmo, mas
dependem dos nossos propósitos, dos nossos planos, são produto de uma
interpretação.
Erwin
Goffman (1922-1982) Focalizou-se nas interacções face a face:
os encontros entre os actores.
Formalizou coisas que nós já conhecíamos, no entanto, elas, a partir de
Goffman, ganham o carácter de revelação. A linguagem verbal, o vestuário, a
ornamentação são vistos como importantes na regulação dos encontros. Cada qual quer aparecer como certo tipo de
pessoa diante dos outros. O actor tem que ter capacidades de representação
de um papel determinado.
Discussão:
Goffman
- Consenso operacional
- Natureza do acordo
- Projecção inicial (definição da situação) de cada participante
- Fidelidade de cada um à projecção na sequência de interacções
- Fachada: cenário; pessoal (aparência, maneira)
- Acentuada institucionalização das fachadas
- Dramatização
- Idealização (ocultação de determinadas coisas negativas no desempenho dos actores
- Manutenção do controlo expressivo no desenrolar do encontro (linguagem verbal e não verbal); competência dos actores na decifração destes aspectos
- Trabalho de equipa (fachada/bastidores)
Anselm
Strauss (1916-1996)
- Interacção face a face
- Dinâmicas organizacionais/ negociação
- Mundo Social
- Epistemologia
Sistemas sociais
nas organizações na perspectiva do desenvolvimento de processos de negociação permanente – parte integrante da dinâmica
da organização. Ordem social negociada.
Controvérsia na definição das
situações.
Para Strauss, a
ideia de negociação não corresponde à mesma circulante no senso comum. Como as
ideias de dramatização e de idealização em Goffman. A negociação,
muitas das vezes, nem sequer decorre de uma formalização ou dum esforço de
explicitação das acções, mas sim da própria trama das interacções. Carácter tácito: não verbalmente expresso e
acordado. Ajustamentos que passam pelas posturas corporais, o conteúdo e a
forma da verbalização: algo que exige uma observação, avaliação e pressuposição
de uma tipicidade de situações, objectos e personalidades.
Strauss estudou
equipas que acompanhavam os doentes em hospitais psiquiátricos. De acordo com
os graus de patologia e a sua evolução, a estrutura social do grupo (estatutos,
papéis) mudava continuamente. A estrutura deveria ser encarada como um
processo, apesar dessa estrutura estar à partida razoavelmente codificada.
Strauss
desenvolveu a noção de trabalho da
doença: trabalho dos sentimentos do doente, trabalho de dar informações ao
doente, trabalho de conforto, trabalho de articulação. Há diferentes tipos de trabalho nos processos organizacionais.
Noção de mundo social
Mundo da ópera;
mundo do surf, mundo da música country; mundo dos coleccionadores de selo.
Caracterizados por uma certa fluidez. Diferente das organizações.
Rede de actores
cooperando em actividades específicas: inventam categorias, traçam fronteiras. Há uma certa estruturação e generalidade da
mesma. Há interesses comuns. Há relações de concorrência. Existem lugares
físicos, geográficos onde essas actividades se desenvolvem, existem
tecnologias, procedimentos, uma divisão do trabalho, normas. Tende para uma
certa estabilização com o surgimento de instituições especializadas.
Epistemologia
Ideia principal:
teoria enraizada. Devemos ser sempre
modestos em termos teóricos. Não devemos partir com teorias prévias na análise
sociológica. Mas, começar sempre por um inquérito empírico minucioso. Levar a
cabo operações como codificação e categorização. Aos poucos deixa-se emergir a teoria
em função do que se vai revelando pertinente.
ETNOMETODOLOGIA
Harold Garfinkel
é o seu proponente
- Origens
- Noções básicas
- Estudos empíricos
Max Weber acção
social: tem sempre um significado
para os actores e tem em conta na sua orientação, as condutas dos outros.
Alfred Schütz
argumenta que o conceito de acção social de Max Weber, não coloca
suficientemente em evidência a natureza
inter-subjectiva do mundo social (mundo de significados partilhados), que
está na base da sua objectividade.
Tipificações Operações
e procedimentos do senso-comum que especificam aquilo que é típico. A linguagem
é um meio poderoso de produção de tipificações. O conhecimento obtido, que tem
uma natureza essencialmente prática,
traduz-se num “stock” de conhecimentos.
Não procura levar a cabo uma indagação sobre a verdade de forma sistemática
como o conhecimento científico (construções de segundo grau), que utiliza uma
série de conhecimentos padrão devidamente formalizados e explicitados. Procede
por receitas.
O conhecimento
científico deve tentar restituir a inteligibilidade das construções de primeiro
grau (senso comum).
Aaron Cicourel
Hugh Mehan
O preceito
central desta perspectiva é tratar os factos
sociais como realizações interactivas de natureza prática. Os factos sociais não são coisas, são
realizações práticas dos actores. Têm um carácter auto-organizado e são produzidas no seu decurso localmente. Ela está disponível, é útil
e reconhecida pelos protagonistas.
Métodos dos membros Conjunto dos
procedimentos sistemáticos necessários para que a auto-organização das
actividades possa ocorrer. Não são problematicamente apreensíveis pelos outros.
Membros são aqueles que pertencem à mesma cultura: têm os mesmos métodos de
produção e de interpretação das actividades. Requer o domínio progressivo da
linguagem comum. Uma vez afiliados no grupo, os seus membros já não se
interrogam sobre o que fazem; conhecem os implícitos do quotidiano.
A norma não determina a situação, a norma é utilizada
pelos membros, como um recurso, para construir a situação.
As actividades
quotidianas devem ser o objecto privilegiado da observação; são a trama do social.
Noção de indexicalidade A partir da linguagem: as palavras
só têm um significado pleno no seu contexto de utilização: a palavra tem que
ser indexada ao contexto da troca linguística. Têm uma incompletude natural –
presente em todas as formas simbólicas - e não uma significação universal. Todas as trocas
sociais apresentam essa propriedade de indexicalidade.
Noção de inteligibilidade Racionalidade das acções, o que
permite aos actores iniciarem descrições
sobre aquilo que fazem e protagonizam. Informação básica para os
etnometodólogos. Os actores não têm verdadeiramente consciência do carácter
metódico e racional das suas acções, pelo que a etnometodologia pretende
reconstituir essas mesmas competências.
Nunca há
equivalência entre o jogo e as suas regras. A competência do árbitro não está
apenas no conhecimento das regras, mas está na sua competência de as aplicar
devidamente. De acordo com a sua conveniência.
O actor interpreta-las à sua maneira, de uma forma mais pessoal.
ETNOMETODOLOGIA
(fim)
Método
documental de interpretação
Identificação de um padrão subjacente ao conjunto de aparências.
Para contrabalançar a indexicalidade das interacções e da linguagem
(comunicação). Os actores estão activamente empenhados em encontrar padrões de
actuação para poderem actuar em conformidade os
actores mobilizam as suas competências, essencialmente práticas, os seus
métodos.
Procuram os
actores indícios relevantes subjacentes às interacções no decurso das suas
actividades.
O método
documental é usado tanto pelos actores membros como pelos sociólogos.
Procedimentos a
efectuar, segundo um padrão, para o não familiar da situação (experiência de
Garfinkel): dar sentido:
- Atribuição de
uma intenção aos actores;
- Esperar pelas respostas seguintes no
sentido de as poder articular de uma forma mais congruente, ainda não alcançada
procedimentos
retrospectivos-prospectivos (método).
Noção de reflexividade Os actores referem-se a
elementos básicos do contexto da interacção para poder ir dando sentido ao que
se está a passar.
Mehan e
Ciccourel fizeram uma observação de sala de aula do ensino primário de como os
alunos adquiriam determinado saber; de como se tornavam competentes aos olhos
dos professores; de como os alunos lidavam com as regras emanadas dos
professores, a partir da totalidade das interacções. Há um saber do social,
adquirido pelos alunos, em paralelo com o saber escolar.
Crítica aos
testes de capacidade intelectual (Mehan):
- o significado
das perguntas que vêm nos testes não é o mesmo para todos; como tal não remetem
necessariamente para a capacidade de raciocínio;
- quem aplica os
testes não é um elemento neutral no acto da sua aplicação; trata-se de uma
interacção social: o resultado dos testes é localmente produzido.
Balanço final
da etnometodologia
A ordem social é
uma realização permanente: a
familiaridade do social é uma espécie de milagre incessantemente renovado.
É a perspectiva
que leva mais longe o preceito sociológico de “tornar estranho o que é
natural”, ao indagar os métodos dos actores.
Os actores não
se interrogam sobre os seus métodos, trata-se de competências de natureza
prática que os habilitam nas suas realizações.
Crítica aos
métodos “objectivos” utilizados pelos sociólogos profissionais. A qual a
própria sociologia incorporou.